quarta-feira, 7 de novembro de 2012

O outro lado do bullying


Para se falar sobre o bullying seria interessante saber a sua definição: "Bullying é uma situação que se caracteriza por agressões intencionais, verbais ou físicas, feitas de maneira repetitiva, por um ou mais alunos contra um ou mais colegas. O termo bullying tem origem na palavra inglesa bully, que significa valentão, brigão. Mesmo sem uma denominação em português, é entendido como ameaça, tirania, opressão, intimidação, humilhação e maltrato. " 

Como podemos perceber, o termo bullying é extremamente beligerante, ou seja, significa algo que nem de perto promove a paz.

Lembro-me que ao longo de minha vida estudantil presenciava alguns episódios que quase se enquadravam na descrição acima. Muitas das brincadeiras ou zoações, que hoje seriam considerados bullying, ocorriam basicamente devido ao tipo físico da pessoa. O caso mais marcante foi de um colega a quem todos chamavam de "Jarrão", pois se parecia com o protagonista da propaganda do Ki-Suco,  refresco em pó açucarado e colorido, sucesso absoluto entre os jovens da época. Acredito que em todo o Brasil deveriam haver milhares de outros jarrões.

Entretanto, nos dias atuais, esta agressividade do bullying parece ocorrer não só pela aparência, mas por alguns motivos implícitos dos quais as vítimas e parentes não possuem conhecimento. Daí esta agressão ser continuada e acontecer por todo o momento em que o agressor e vítima estiverem juntos.

Engana-se quem pensa que ocorre somente entre adolescentes, pois há o bullying em qualquer lugar que exista grupo e em todas as faixas etárias. Entretanto a pressão social inibe esta agressão entre as pessoas mais maduras. Por isso, noticia-se somente entre adolescentes, pessoas cujos aparelhos psíquicos encontram-se em formação, onde o super-ego ainda é frágil.

Como já dito em posts anteriores, na resolução bem sucedida do Complexo de Édipo, o menino incorpora os conceitos e limites impostos pelo seu pai, tomando-o com exemplo. Portanto, se este pai é agressivo e possui poucos limites, o jovem será potencialmente violento. 

Outro conceito que devemos ter em mente quando falamos sobre bullying é o da existência de uma relação sado-masoquista entre os envolvidos, em que o agressor é o sádico e a vítima é o masoquista. Esta relação, apesar de aparentemente incoerente, não se interrompe com facilidade.

Finalmente, para se entender completamente o porquê da existência do bullying, devemos conhecer o universo dos adolescentes, o que fazem, como vivem e, principalmente, da importância exacerbada, quase que uma necessidade fisiológica de participar de grupos. E justo por esta última característica, se origina o  bullying: - a rejeição do grupo ao adolescente que gostaria de fazer parte dele.

Portanto o bullying só ocorre quando existe uma confluência de três elementos que, caso não estivessem presentes, não aconteceria:     

  • - Deve haver o agressor, que na realidade é vítima de uma família mal estruturada. Sabemos que este tipo costuma se dar mal quando encontra um semelhante mais forte, pois costuma resolver seus conflitos na "marra".
  • - Deve existir a vítima do bullying que possui fortes componentes masoquistas em sua personalidade para persistir neste esquema de querer ser aceito pelos outros. Do contrário evitaria o conflito. 
  • - Deve existir o grupo agressor.

Como já escrito também anteriormente, quando juntos, os jovens  incorporam o super-ego do grupo o qual fazem parte. Se este for liderado por alguém com perfil violento, todos passam a assumir o mesmo comportamento. A agressividade costuma ser direcionada a qualquer pessoa e não somente para a vítima do bullying, entretanto nem todos se sentem abalados, notadamente aqueles que não fazem questão alguma de serem aceitos como membro ou mesmo simpatizante daquele grupo.

Como conclusão, podemos dizer que todos os envolvidos necessitam de tratamento e acompanhamento psicológico, e que infelizmente a vítima, de forma inconsciente, contribui para a existência deste tipo de agressão. Porém, independente das justificativas psicanalíticas  para sua ocorrência, o bullying deve ser observado e reprimido pelos monitores e professores, pois trata-se de um ato covarde e não civilizado, completamente inadequado em qualquer estabelecimento de ensino. Campanhas educacionais que visem seu fim muito provavelmente não obterão êxito, mas ao menos servirão de alerta e esclarecimento para aqueles que nunca tiveram experiência com esta prática a fim de que possam reconhecer quando em curso.


   

terça-feira, 28 de agosto de 2012

O fascinante mundo da loucura



De médico e louco, cada um tem um pouco. Sinceramente não lembro quando escutei esta frase pela primeira vez, talvez enquanto assistia à série de comédia debochada M.A.S.H. que se passava num ambulatório do exército americano durante a guerra do Vietnam ou se durante algum filme do grupo inglês Monty Python. O fato é que a loucura se manifesta em cada indivíduo das mais diversas formas. E por que me veio à cabeça esta frase?

Durante a semana conversei sobre gente com diferentes pessoas e quatro personalidades já não existentes entre nós, foram citadas: Steve Jobs, o profeta Gentileza, Adolf Hitler e Leonel Brizola. Pode-se dizer que trata-se de uma insólita combinação de elementos destoantes que viveram em épocas e locais totalmente distintos entre si. Em comum entre eles, uma vida frugal dedicada à defesa intensa de suas crenças, a conquista de devotos e seguidores e, finalmente, um traço sutil da loucura de um universo esquizofrênico.

O "profeta" Gentileza que vivia nas ruas do Rio pregando a paz entre os cidadãos, hoje é quase considerado um monge tibetano, figurando nas redes sociais através de seu simplório pensamento filosófico. Hitler acreditou ser o salvador da Alemanha, o escolhido que veio ao mundo promover a pureza da raça ariana através do extermínio dos judeus. Leonel Brizola, como sintoma patológico, enxergava agentes da CIA e FBI até no banheiro da própria casa. E, finalmente Steve Jobs, que pensava ser infalível, morreu jurando que somente ele sabia qual era o objeto eletrônico de desejo dos consumidores. A se destacar, também em comum, a mania de perfeição associada à enorme paixão com a qual desenvolviam suas atividades.

Tive a oportunidade de ver em plena ação na Av. Presidente Vargas no Rio de Janeiro, o profeta Gentileza riscando seus textos no asfalto numa época em que não havia calçadas separando as pistas. Estando num automóvel no trânsito, pude vislumbrar a perfeição e simetria com que escrevia as palavras, repetidas como um mantra e hoje eternizadas pelos seus fãs.

Hitler não perdeu a paixão pela política nem enquanto esteve preso, ocasião que escreveu a bíblia do nazismo, um massante livro chamado "Minha Luta".  Boa parte de seus pensamentos encontram-se naquela interessante obra histórica. Tanto ele, quanto Brizola, devem suas ascensões políticas aos momentos delicados pelos quais seus países atravessavam e pelas convicções de seus discursos.

E finalmente Steve Jobs, cuja paixão por aquilo que vendia, conquistou uma legião de adoradores  convencidos de que ele mesmo inventou o computador Apple ou o iPhone, apesar de não ter a menor noção de como funciona um diodo ou capacitor.

A morte provoca um fenômeno curioso, bastante acentuado entre as viúvas, que é o esquecimento ou atenuação dos defeitos das pessoas falecidas concomitantemente com a supervalorização de suas virtudes ou aparecimento de outras novas até então inexistentes. À exceção de Hitler, que foi rebaixado a louco varrido depois de morto, e Brizola que tornou-se decadente com o fim da guerra fria e descrédito de sua paranoia,  os outros dois viraram ícones,  personalidades marcantes na vida de muitos. Entretanto, enquanto vivos, todos certamente eram donos de um ego gigantesco, incluindo aí o "humilde" Gentileza. Possuíam também manias e defeitos desagradáveis que, felizmente, alcançavam apenas as pessoas mais próximas.

A esquizofrenia é a loucura que mais se faz presente na genialidade e na arte, sendo, às vezes, necessária para o sucesso. O mais legal desta loucura é transformar o mundo e produzir admiradores.


O transtorno mental e sua medicação



No último post, dissertei sobre a necessidade do ser humano normal tomar remédios, mesmo sem motivação aparente. Desta vez falarei sobre a medicação oferecida aos doentes mentais. Estes costumam tomar medicamentos alheios às suas vontades, sem saber ao menos qual sua finalidade. Então porquê tomá-los?

Neste mês recebi convite, e fui, a uma festa de aniversário de um garoto autista. Dentre os colegas, outros autistas. E enquanto as crianças se divertiam, sentei-me à mesa com alguns pais de crianças com esta síndrome que é bastante incapacitante socialmente. Dentre os sintomas desta doença, podemos destacar a hiperatividade, aliás, sintoma presente em muitos portadores de transtornos mentais.

Talvez a hiperatividade seja a maior causa de prescrição para os ditos psicotrópicos em pessoas com transtornos mentais. A hiperatividade, em si, não costuma ser um problema para o autista ou esquizofrênico, porém para a grande maioria dos responsáveis destes seres, representa literalmente um estorvo, dificultando um relaxamento  para recuperar forças a fim de poder dar conta de todas as inúmeras tarefas diárias.

O uso de psicotrópico no tratamento de transtornos mentais representa uma incoerência médica e muitas vezes um excesso. Uma vez que o remédio não cura qualquer mal, atuando apenas sobre os sintomas, seu uso apenas auxilia aos tutores a observar melhor o tutelado, permitindo-lhes alguns momentos de descanso. Deste fato podemos concluir que o verdadeiro beneficiário do remédio não é quem o toma.

Muitas vezes o uso de medicamento é justificado para "reduzir a agressividade". A princípio, também não se encontra na literatura algo que relacione o transtorno mental com a violência, a não ser nos casos em que o doente tenha convivido com isso na infância. De outra forma, não devemos temer pessoas com este tipo de problema. Pessoas sem transtornos mentais também podem possuir um padrão violento, no entanto estas não costumam ser medicadas contra as suas vontades.

Ainda durante a festa, ouvi relatos acerca da dificuldade em se estabelecer uma relação normal entre pais e filhos com autismo ou outro transtorno. Algumas vezes perguntava a estes pais, cujos filhos encontravam-se medicados, se eles teriam coragem de tomar o mesmo remédio, geralmente antipsicóticos, que davam para seus filhos e, caso tomassem, o que aconteceria. Todos diziam que não tomariam porque se tomassem, muito provavelmente ficariam alterados em seus pensamentos.

Achei bastante interessante a resposta, e sempre os lembrava que seus filhos encontravam-se alterados em seus pensamentos naquele momento pelo uso do medicamento.  Sem que estejam em seu estado "normal", eles jamais serão autênticos em suas relações. Certamente seus relacionamentos poderiam ser melhorados sem a intermediação de qualquer substância química. A suspensão do uso de medicamentos representa certo sacrifício num primeiro momento, porém a longo prazo costuma ser compensador.

Sugeri a todos eliminarem de vez estes remédios que não trazem nenhum benefício ao próprio doente. Sinceramente não sei se seguirão meu palpite, muitos pareciam estar realmente precisando de um descanso.


segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

A medicalização da saúde




Há bem pouco tempo, as pessoas iam ao médico e voltavam frustradas quando o "doutor" dizia: - você não tem nada. Ficavam mais indignadas quando ele não prescrevia nem, ao menos, uma vitaminazinha. Entretanto os tempos são outros e  não fiquei surpreso ao ler uma reportagem interessante que falava sobre um check-up customizado, que nada mais significa que a realização de uma bateria de exames com o objetivo de verificar a existência de doenças em seu estágio inicial e assim poder combatê-las com maior facilidade. O grande mote destes exames chama-se prevenção, o que exime de culpa os impulsos hipocondríacos de quem procura tais serviços.

As pessoas previnem-se ao colocarem o cinto de segurança antes de assumirem os volantes dos seus automóveis que possuem freios ABS e air-bags para o caso de haver um acidente. As pessoas também se  previnem ao colocar grades nas janelas para crianças não despencarem ou ladrões não subirem por lá, situações estas que justificamos a prevenção a fim de evitarmos possíveis acontecimentos que poderiam vir a trazer graves consequências.

Mas fazer um check-up significa algum tipo de prevenção? No caso de nenhuma doença aparecer, nada há de excepcional, porém se algo mais delicado que uma gripe for detectado, não há mais o que se falar em prevenção, mas sim em tratamento e cura. Uma vez a doença estar estabelecida não a prevenimos, tratamos-a. Cada ser humano comporta-se de maneira distinta diante das adversidades. A doença é a maior delas pois atinge-o diretamente, sem intermediações. Portanto, cabe somente ao próprio sujeito reagir de maneira adequada em busca de sua almejada saúde.

Quando em um naufrágio, incêndio ou outra situação inesperada, qualquer um se utiliza de todos os meios para escapar com vida da tragédia, passando enquanto nesta situação, por barreiras intransponíveis ou escalando paredes que num dia ordinário jamais seriam superadas, tudo em nome do "instinto de sobrevivência".

Porém, em se tratando de doenças, esta superação não costuma ser tão eficaz. Tão logo tenha conhecimento de que possui algum mal, o sujeito pode se comportar de diferentes maneiras a tão desagradável notícia. Há os que desanimam e logo padecem. Há outros que terceirizam sua cura deixando por conta dos médicos, esperando que a sapiência destes aliada a alta tecnologia resolvam seu problema. Também existem aqueles que lutam bravamente, pensam positivo e partem para todas as receitas que possam trazer um resultado satisfatório nesta sua guerra pessoal pela vida. O certo é que a partir do primeiro diagnóstico todos que tomam ciência do fato, iniciam intimamente uma contagem regressiva de tempo de vida do doente.

Não são poucos os casos de pessoas aparentemente saudáveis que após "exames de rotina" descobrem doenças até então despercebidas, vindo a falecerem em pouco tempo. Infelizmente, ficam com suas vidas muito mais abreviadas do que se continuassem na mais completa ignorância sobre seus sintomas muitas vezes nem sentidos.

Tudo isso lembrou-me o velho ditado que diz que um homem prevenido vale por dois. Apesar de confiar muito nos ditados populares, particularmente nunca gostei deste. Ao ouvi-lo pela primeira vez, ainda criança, pensei no que aconteceria se ele passasse numa ponte que suportasse apenas uma pessoa. Certamente não sobreviveria para testemunhar a longevidade dos imprudentes.