terça-feira, 28 de agosto de 2012

O fascinante mundo da loucura



De médico e louco, cada um tem um pouco. Sinceramente não lembro quando escutei esta frase pela primeira vez, talvez enquanto assistia à série de comédia debochada M.A.S.H. que se passava num ambulatório do exército americano durante a guerra do Vietnam ou se durante algum filme do grupo inglês Monty Python. O fato é que a loucura se manifesta em cada indivíduo das mais diversas formas. E por que me veio à cabeça esta frase?

Durante a semana conversei sobre gente com diferentes pessoas e quatro personalidades já não existentes entre nós, foram citadas: Steve Jobs, o profeta Gentileza, Adolf Hitler e Leonel Brizola. Pode-se dizer que trata-se de uma insólita combinação de elementos destoantes que viveram em épocas e locais totalmente distintos entre si. Em comum entre eles, uma vida frugal dedicada à defesa intensa de suas crenças, a conquista de devotos e seguidores e, finalmente, um traço sutil da loucura de um universo esquizofrênico.

O "profeta" Gentileza que vivia nas ruas do Rio pregando a paz entre os cidadãos, hoje é quase considerado um monge tibetano, figurando nas redes sociais através de seu simplório pensamento filosófico. Hitler acreditou ser o salvador da Alemanha, o escolhido que veio ao mundo promover a pureza da raça ariana através do extermínio dos judeus. Leonel Brizola, como sintoma patológico, enxergava agentes da CIA e FBI até no banheiro da própria casa. E, finalmente Steve Jobs, que pensava ser infalível, morreu jurando que somente ele sabia qual era o objeto eletrônico de desejo dos consumidores. A se destacar, também em comum, a mania de perfeição associada à enorme paixão com a qual desenvolviam suas atividades.

Tive a oportunidade de ver em plena ação na Av. Presidente Vargas no Rio de Janeiro, o profeta Gentileza riscando seus textos no asfalto numa época em que não havia calçadas separando as pistas. Estando num automóvel no trânsito, pude vislumbrar a perfeição e simetria com que escrevia as palavras, repetidas como um mantra e hoje eternizadas pelos seus fãs.

Hitler não perdeu a paixão pela política nem enquanto esteve preso, ocasião que escreveu a bíblia do nazismo, um massante livro chamado "Minha Luta".  Boa parte de seus pensamentos encontram-se naquela interessante obra histórica. Tanto ele, quanto Brizola, devem suas ascensões políticas aos momentos delicados pelos quais seus países atravessavam e pelas convicções de seus discursos.

E finalmente Steve Jobs, cuja paixão por aquilo que vendia, conquistou uma legião de adoradores  convencidos de que ele mesmo inventou o computador Apple ou o iPhone, apesar de não ter a menor noção de como funciona um diodo ou capacitor.

A morte provoca um fenômeno curioso, bastante acentuado entre as viúvas, que é o esquecimento ou atenuação dos defeitos das pessoas falecidas concomitantemente com a supervalorização de suas virtudes ou aparecimento de outras novas até então inexistentes. À exceção de Hitler, que foi rebaixado a louco varrido depois de morto, e Brizola que tornou-se decadente com o fim da guerra fria e descrédito de sua paranoia,  os outros dois viraram ícones,  personalidades marcantes na vida de muitos. Entretanto, enquanto vivos, todos certamente eram donos de um ego gigantesco, incluindo aí o "humilde" Gentileza. Possuíam também manias e defeitos desagradáveis que, felizmente, alcançavam apenas as pessoas mais próximas.

A esquizofrenia é a loucura que mais se faz presente na genialidade e na arte, sendo, às vezes, necessária para o sucesso. O mais legal desta loucura é transformar o mundo e produzir admiradores.


O transtorno mental e sua medicação



No último post, dissertei sobre a necessidade do ser humano normal tomar remédios, mesmo sem motivação aparente. Desta vez falarei sobre a medicação oferecida aos doentes mentais. Estes costumam tomar medicamentos alheios às suas vontades, sem saber ao menos qual sua finalidade. Então porquê tomá-los?

Neste mês recebi convite, e fui, a uma festa de aniversário de um garoto autista. Dentre os colegas, outros autistas. E enquanto as crianças se divertiam, sentei-me à mesa com alguns pais de crianças com esta síndrome que é bastante incapacitante socialmente. Dentre os sintomas desta doença, podemos destacar a hiperatividade, aliás, sintoma presente em muitos portadores de transtornos mentais.

Talvez a hiperatividade seja a maior causa de prescrição para os ditos psicotrópicos em pessoas com transtornos mentais. A hiperatividade, em si, não costuma ser um problema para o autista ou esquizofrênico, porém para a grande maioria dos responsáveis destes seres, representa literalmente um estorvo, dificultando um relaxamento  para recuperar forças a fim de poder dar conta de todas as inúmeras tarefas diárias.

O uso de psicotrópico no tratamento de transtornos mentais representa uma incoerência médica e muitas vezes um excesso. Uma vez que o remédio não cura qualquer mal, atuando apenas sobre os sintomas, seu uso apenas auxilia aos tutores a observar melhor o tutelado, permitindo-lhes alguns momentos de descanso. Deste fato podemos concluir que o verdadeiro beneficiário do remédio não é quem o toma.

Muitas vezes o uso de medicamento é justificado para "reduzir a agressividade". A princípio, também não se encontra na literatura algo que relacione o transtorno mental com a violência, a não ser nos casos em que o doente tenha convivido com isso na infância. De outra forma, não devemos temer pessoas com este tipo de problema. Pessoas sem transtornos mentais também podem possuir um padrão violento, no entanto estas não costumam ser medicadas contra as suas vontades.

Ainda durante a festa, ouvi relatos acerca da dificuldade em se estabelecer uma relação normal entre pais e filhos com autismo ou outro transtorno. Algumas vezes perguntava a estes pais, cujos filhos encontravam-se medicados, se eles teriam coragem de tomar o mesmo remédio, geralmente antipsicóticos, que davam para seus filhos e, caso tomassem, o que aconteceria. Todos diziam que não tomariam porque se tomassem, muito provavelmente ficariam alterados em seus pensamentos.

Achei bastante interessante a resposta, e sempre os lembrava que seus filhos encontravam-se alterados em seus pensamentos naquele momento pelo uso do medicamento.  Sem que estejam em seu estado "normal", eles jamais serão autênticos em suas relações. Certamente seus relacionamentos poderiam ser melhorados sem a intermediação de qualquer substância química. A suspensão do uso de medicamentos representa certo sacrifício num primeiro momento, porém a longo prazo costuma ser compensador.

Sugeri a todos eliminarem de vez estes remédios que não trazem nenhum benefício ao próprio doente. Sinceramente não sei se seguirão meu palpite, muitos pareciam estar realmente precisando de um descanso.